segunda-feira, 30 de junho de 2008

Uma nova utopia

Segunda feira é o meu dia de contar histórias na creche Fazer Arte. Esse é o dia de me sentir nas nuvens! Passo a semana inteira pensando na história mais legal e em como interpretar os personagens, o modo de apresentar os autores, o cenário e a narrativa... A cada encontro, me surpreendo com as respostas das crianças: sempre tão verdadeiras. Hoje por exemplo, quando perguntei para uma das crianças: de quem é a voz que conversava com Bino (o personagem principal da história "Feliz aniversário, Lua" de Frank Asch)? Ele simplesmente criou um novo personagem e me respondeu: é claro que é da formiguinha, lua não fala! Nesse momento, me recusei a dar qualquer outra versão, simplesmente porque eu não seria capaz de encontrar algo mais criativo e inteligente.

Engraçado que no Brasil, o cidadão que comete um crime considerado leve é obrigado a cumprir uma "pena alternativa": fazer um trabalho social. Hoje as crianças da Fazer Arte me ensinaram que o trabalho social deveria ser encarado como uma recompensa. Já imaginou uma escola premiando os seus melhores alunos com uma dessas oportunidades: estar com crianças carentes; contar histórias para idosos; ensinar um ofício para moradores de rua, ou... tantas outras coisas que poderiam fazer esse aluno se sentir ainda mais gente de valor no mundo? Já pensou uma empresa premiando seus funcionários com essa mesma possibilidade? No mínimo teríamos duas oportunidades: mais pessoas de bem se envolvendo em trabalhos sociais e uma maior valorização dessa atividade.

O melhor mesmo seria transformar essa moda em status: sabia que fulano é voluntário? - nossa! - jura? - como ele conseguiu? - pai, quando eu crescer, quero ser voluntário!

Na montagem abaixo, os registros de um momento especial, quando levei uma aluna do sexto ano para experimentar um dia de voluntariado. Pela carinha dela e das demais crianças você pode perceber como essa experiência deve ter sido marcante para elas.

domingo, 29 de junho de 2008

O Castigo do deus César Maia

Os motoristas que ousam estacionar nas ruas do Rio de Janeiro estão sujeitos aos mais diversos tipos de extorsão. Dos donos da rua vestidos de coletes cinzas aos reboqueiros oficiais, todos estão prontos para abocanhar uma fatia da parca economia dos contribuintes fluminenses.

Recentemente, tive o meu veículo rebocado na Rua Assis Bueno em Botafogo, próximo a uma das escolas onde leciono. Não pretendo aqui discutir o mérito do reboque, executado em um trecho em que não havia nenhuma placa para avisar a proibição do estacionamento. O que move esse texto é a indignação pelo tratamento a que fui submetida: incompatível com o conceito de cidadania, tão difundido nos programas da prefeitura.

Assim que soube que o meu carro foi rebocado, me dirigi ao Detran da Presidente Vargas. Lá, ouvi um dos atendentes dizendo a outro cidadão: "Talvez você não consiga resgatar o seu carro hoje, afinal, é sexta feita e ninguém gosta de trabalhar até mais tarde". Sem olhar para mim, o mesmo atendente me deu um pequeno papel amassado com um endereço e me avisou que antes de mais nada eu deveria ir ao local. Antes de me dirigir para lá resolvi passar no Itaú para pegar o nada-consta, como um amigo, não os profissionais do detran, havia me orientado. Chegando ao tal endereço - Andradas 96 - recebi um papel e soube que eu deveria ir ao Detran e retornar para pegar o boleto de pagamento. Perguntei à atendente se eu não poderia já levar o tal boleto e ela nem se deu o trabalho de me responder. No Detran encontrei uma fila enorme e aguardei a minha senha. Quando finalmente fui atendida, descobri que deveria voltar à sala de espera para aguardar que me chamassem novamente. Dessa vez não haveriam senhas: os nomes das pessoas eram "berrados" pelos atendentes. Quando berraram o meu nome pulei da cadeira e recebi um novo papel para levar novamente à Rua dos Andradas. Chegando lá, a espera foi ainda maior pois havia um único guichê de atendimento.

Enquanto eu aguardava, li no quadro de avisos um comunicado da prefeitura avisando que a frota de reboques estava sendo triplicada e a fiscalização também ganhava novos reforços. Para o prefeito do Rio de Janeiro, a punição é o meio para educar seus eleitores e resolver o caótico trânsito do Rio de Janeiro. Ainda durante a espera, presenciei vários motoristas revoltados com o reboque de seus veículos. Muitos denunciavam as irregularidades do procedimento, mas a única a ouvir as queixas era a pobre da atendente. Senti pena daquela alma! Ao ser chamada, descobri que o meu carro havia sido depositado na Praça Onze, o que me pareceu um alívio, afinal, eu poderia ter que buscá-lo em Caxias ou em outros lugares ainda mais distantes onde a prefeitura amplia a sua eficiente rede de "arrecadação".

Para economizar, afinal o meu orçamento de professora não previa todas aquelas taxas municipais, resolvi ir de metrô e seguir o restante à pé. Enquanto eu caminhava no sol escaldante do Rio de Janeiro, chorei como um menino diante de um poderoso tirano e pensava nas razões que fazem um governante penalizar os seus contribuintes daquele modo. Não seria possível resolver todo o problema em um único local de forma rápida e eficiente? Não poderia o contribuinte, neste mesmo local, denunciar as irregularidades e ter uma pronta resposta? Talvez sim, em um futuro que espero ser próximo, com eleitores conscientes das consequências de um voto sucessivamente equivocado.



* Perdão se você já tiver lido esse texto. Na ocasião do reboque publiquei uma versão semelhante no "reclame aqui" e enviei para os meu amigos. Até agora a prefeitura não se pronunciou, por isso resolvi botar de novo a boca no trombone, quer dizer, no blog - principalmente porque o número de visitantes, felizmente, está crescendo - graças ao apoio dos visitantes fofos que indicam o blog para outras pessoas. Se você é um deles, obrigada!

sábado, 28 de junho de 2008

Um tal de Frank Asch

A primeira vez que vi a minha filhinha apaixonada por uma história foi com "Feliz Aniversário, Lua" de Frank Asch. Realmente a história é encantadora. Com traços simples e um texto inteligente, o livro de Asch envolve a minha pequena leitora do início ao fim.

Acabo de descobrir o site dele
e esse é o presente que trago para você hoje: http://www.frankasch.com/animatedbooks

Mesmo que os livros animados sejam exibidos apenas em inglês, vale a pena apresentá-los às crianças. A Luisa amou todas as histórias, mas a minha preferida é a dos ursos na praia. O pai do urso é genial: ainda bem que a minha filhota também tem um pai incrível!

Espero que essa descoberta seja divertida e que você curta esse presente na companhia de uma criança incrível - mesmo que ela esteja apenas dentro de você!



quarta-feira, 25 de junho de 2008

Dinheiro não traz aprendizagem

Através do endereço http://www.bbc.co.uk/portuguese/reporterbbc/story/2008/06/080617_spelling_bee_dg.shtml é possível descobrir o segredo do vencedor do concurso "soletrando" dos EUA. Aliás, essa estratégia pode ser responsável pelo sucesso do indivíduo na escola e na vida. Trata-se de algo simples mas cada vez mais raro: o envolvimento familiar na construção do conhecimento.

Já falei aqui sobre aqueles pais que, para pagar uma escola conceituada, trabalham tanto que não conseguem tempo para conviver com os filhos, lembra? Pois bem, a experiência do garoto vencedor desse concurso nos ensina que investir presença, interesse e cuidado é muito mais importante.

A reportagem conta como os pais das crianças que se destacam no concurso se envolvem ativamente com a possível conquista do prêmio, sendo comum até pedirem licença no trabalho para que os filhos se sintam mais preparados. Ao ler isso, fiquei pensando nos meus alunos e em como seria bom se todos os pais enxergassem a possibilidade de um prêmio, ainda que seja formar gente. Pensei especialmente nos meus alunos que apresentam déficit de aprendizagem, mesmo tendo uma inteligência notável. Percebo que o desânimo e o descompromisso com o saber é potencialmente maior quando os alunos não contam com e o cuidado que deveria existir em casa. Muitos desses alunos saem bem cedinho para a escola e só retornam tarde da noite porque precisam ter um número enorme de aulas particulares, mesmo que eles tenham uma boa escola e professores competentes.

Já pensou se todos os alunos que costumam fracassar nas notas recebessem estímulo, atenção e carinho necessários para o enfrentamento da jornada extensa que terão no dia seguinte?

Para os pais que desejam participar ativamente da aprendizagem de seus filhos, seguem três dicas: procure ter interesse pelo conhecimento que seu filho está ou deveria estar adquirindo na escola;se for o caso, peça para que ele te ensine o tema trabalhado. Não tenha vergonha de aprender com seu filho. Isso vai fazê-lo se sentir muito importante.sempre que possível, faça programas relacionados ao conhecimento: museu, praças, cinema, teatro... são espaços privilegiados do conhecimento; Caso essas dicas tenham algum efeito, me escreva, ok?

domingo, 22 de junho de 2008

Parto em casa: loucura ou retorno às raízes?

"Mesmo antes de ser concebido, esse bebê morava no seu coração. Ela costumava olhar adiante e sabia que, quando engravidasse, daria a seu filho experiências de uma intimidade deliciosa, imagens extasiantes e avanturas em bibliotecas povoadas de lembranças."

Com esses versos, de Laura Uplinger & Jack Bresnahan inicio o relato de uma experiência que considero privilegiada no curso "Ecologia do Parto" promovido por Heloísa Lessa. Com a generosidade de quem de fato defende o parto humanizado, Helô decidiu compartilhar sua biblioteca. O livro de poemas "De ventre em popa", que guarda o verso acima, é um de seus tesouros. Cada artigo que ela cuidadosamente seleciona e entrega nos encontros mensais é uma descoberta de como o visceral ato de dar a luz é, ou deveria ser, um assunto que interessa a todos.

Dentre os diversos autores selecionados por Heloísa Lessa, Michel Odent recebe atenção especial: ele é um dos convidados do curso. Na semana passada, tive a oportunidade de conhecer e ouvir esse profissional incrível que nos contou sobre a sua trajetória. No início de sua carreira, Odent atuou como cirurgião durante a guerra da Argélia e aprendeu as técnicas de cesariana horizontal. Na década de 60, ele atuou em uma maternidade francesa, ao lado de parteiras profissionais e junto com elas refletiu sobre a necessidade de modificação do ambiente do parto, introduzindo técnicas inovadoras como a piscina e o canto. A instalação de piscinas visava introduzir no local de nascimento o mesmo meio de vida onde saíram todas as formas de vida, enquanto que o canto resgatava as relações entre a garganta e a vagina que estão ligadas anatomicamente pelo mesmo canal. No filme abaixo é possível assistir alguns partos incríveis feitos na água:




Ao mudar-se para a Inglaterra, Odent passou a refletir e escrever suas experiências e a colaborar no parto de mulheres que optavam em ter seus filhos em casa. Esse trabalho, que ele desenvolve até hoje, consiste basicamente em distrair os pais no momento em que a mulher dá a luz ao lado de uma parteira experiente e capaz de permanecer calada enquanto a mãe e o bebê desempenham o seu papel de protagonistas.

De certo modo, a opção de Odent pelo parto em casa é uma resistência ao modelo hegemônico que prioriza intervenções como a insensibilidade do corpo materno através da peridural. A experiência vivida por ele e pelas parteiras, bem como o acesso à informação sobre o comportamento de outros mamíferos durante o parto permitiram que Odent defendesse o papel dos anestésicos naturais liberados pelo organismo ao dar a luz e a indução do comportamento maternal por essas substâncias. As idéias de Odent são contrárias ao modelo da maioria dos hospitais, mesmo aqueles em que o parto ocorre pelas vias naturais - o que é cada vez mais raro no Brasil. Elas estão respaldadas em pesquisas que associam o uso de substâncias anestésicas artificiais à inibição da contração uterina e a utilização de eletrodos de monitoramento com o aumento de intervenções como o uso de ventosas e do fórceps.

Para Odent, o parto e o nascimento são momentos privilegiados que podem conduzir às raízes do ser humano. Prova disso é que a mulher, ao dar à luz, caso não seja inibida, tende a simplificar seu vocabulário e a usar as palavras aprendidas na primeira infância. Além disso, a necessidade do recém-nascido de estabelecer um contado com a mãe antecede à fome. No entanto, nos atuais moldes hospitalares contemporâneos, muitas mulheres são impedidas de externar sentimentos que desencadeariam o papel de protagonistas no momento do parto e o mais grave: podem ser privadas de manter um contato pleno com seus filhos recém-nascidos.

Uma das idéias defendidas por Odent é o
período primal, que engloba o momento da concepção até o final do primeiro ano de vida. Para ele, durante esse período que é a gestação do cérebro emocional responsável pela maturidade afetiva, são construídas as estruturas cerebrais que garantem a sobrevivência da espécie. Do ponto de vista molecular, esse é o período em que o DNA, traduz as mais diversas proteínas que irão construir uma memória celular e tecidual: mais do que uma estocagem de informação, trata-se de uma trasformação da esturura vida. Odent defende que esse período deveria receber uma atenção especial de toda a sociedade porque tem reflexos culturais, memoriais e éticos. Para Odent, o curto e crítico período logo após o nascimento pode ser decisivo na capacidade das crianças desenvolverem a capacidade futura para amar. Nesse sentido, as intervenções realizadas durante esse período tem sido apontadas por diversas pesquisas como fatores de risco para disturbios sociais como a criminalidade e o suicídio. Parte dessas pesquisas podem ser acessadas nos sites: www.wombecology.com; www.birthworks.org/primalth; www.obstare.com e www.birthpsychology.com.

No livro "A cientificação do amor" Odent critica a enorme lacuna nas pesquisas científicas que tratam o tema amor e defende que a capacidade de amar e o respeito mútuo estão se tornando pré-requisito de sobrevivência individual e global na sociedade contemporânea. Por outro lado, ele lança mão de alguns experimentos desenvolvidos no campo da biologia como um reflexo para o comportamento humano. Um desses experimentos, desenvolvido por Eugene Morais com antílopes selvagens, apontam relações entre a sedação e a receptividade das mães aos filhotes: quando as fêmeas receberam baforadas de clorofórmio e éter passaram a recusar seus recém nascidos. Odent aponta também alguns experimentos que sugerem a existência de um período sensível no processo de formação do vínculo, como o relato de Konrad Lorenz que conseguiu ficar vinculado com patinhos após imitar o grasnar da mãe pata. Odent lança mão de diversos estudos para correlacionar as intervenções dos hospitais com a dificuldade das fêmeas de outros mamíferos no momento do parto e a perturbação causada pela separação precoce das mães e dos bebês. Uma dessas pesquisas, desenvolvidas nos anos 50 com macacos, separou as mães dos filhotes para amamentá-los com mamadeira. Para substituir as mães, foram utilizados dois tipos de manequins: um acolchoado e outro de ferro. Constatou-se que o principal fator de atração dos bebês macados não era o alimento, mas o aconchego. Ao trabalhar com exemplos comportamentais em outras espécies, Odent alerta que entre os mamíferos não humanos, os efeitos da intervenção são fáceis de revelar, numa escala individual, mas no homem os efeitos são diluídos pela cultura.

Considerando que o vínculo entre a mãe e bebê é o protótipo de todas as formas de amar, Odent combate os rituais que atrapalham o processo fisiológico do parto. Muitos desses rituais ainda são corriqueiros nas nossas maternidades como a pressa para cortar o cordão umbilical, o banho frio, o ato de esfregar o bebê para limpá-lo logo após o parto, o envolvimento do recém-nascido em panos apertados e o uso de ataduras. Odent também critica rituais com fogo, a perfuração da orelha e a abertura de portas em países frios. De todos os rituais descritos por Odent, o que me parece mais perverso é aquele que impede o primeiro contato do bebê com o peito materno. Minha filha, que contra a minha vontade nasceu de cesariana, foi retirada de mim e lançada imediatamente para o pediatra. Só depois do aval dele pude tê-la em meus braços, por um curto período de tempo. Depois disso, me apagaram. Por isso, não quero mais esse modelo hospitalar!

Nos próximos dias continuarei o meu relato. Espero que você tenha gostado. Se sim ou se não, comente!

quarta-feira, 18 de junho de 2008

ESEM SELECIONA PROFESSORES

Finalmente, após longa data, uma boa notícia para os meus colegas educadores: o ESEM está selecionando professores para 2009 e 2010. Calma, eu explico: ESEM é a sigla da Escola de Ensino Médio do Sesc. Situada na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, essa escola tem como proposta ser residencial. Em outras palavras, professores e alunos, de diferentes partes do Brasil, convivem - pelo que eu soube, muito bem, obrigada - em um amplo espaço que privilegia o conhecimento. Os alunos passam por um rigoroso processo de seleção e os professores são bem recompensado pela dedicação que oferecem nas 44 horas disponibilizadas para a escola.

Mas será que ter alunos brilhantes e um salário bem acima da média é o sonho de todos os educadores? Muitos dos meus colegas não se adaptariam a conviver em uma comunidade como essa: ou porque amam a privacidade ou porque detestam alunos. É isso mesmo: fazer um curso de licenciatura não implica na capacitação para amar os educandos. E nesse caso, é preciso muito amor. Afinal, a carência dos jovens que estão longe de suas famílias precisa ser administrada.

Então talvez essa não seja uma boa notícia para todos, mas certamente muitos adorarão a novidade. Eu gostei. Afinal, não é todo dia que as instituições de ensino abrem suas portas para novos professores. Seria bom se isso acontecesse para oxigenar as mentes pensantes das escolas. É claro que não estou defendendo a rotatividade de professores, mas o acolhimento do novo mestre e de preferência que ele traga na bagagem um enorme prazer pelo que faz e o desejo de ensinar e de aprender.

Nesse período de seleção, é preciso que o gestor não perca de vista que sempre haverá no mercado um professor mais bem formado, mais atencioso ou com melhor aparência... mas é como no casamento: aquele que está junto é quem constrói uma história. Conheço alguns dos professores que já compõem a equipe atual do ESEM. Eles iniciaram a narração dessa história e por isso eu torço para que o projeto tenha vida longa!

segunda-feira, 16 de junho de 2008

Leitura de História & História Oral

Qual é o papel das histórias na formação de uma criança? Hoje eu não quero discutir dados científicos, apenas pretendo pincelar algumas reflexões sobre o tema. Para a minha filha de dois anos e nove meses, é maravilhoso ouvir histórias. Eu compartilho esse prazer deixando que ela fique no meu colo e namore com as letras e desenhos incríveis que vão se abrindo diante dela.

Por isso, já virou rotina: assim que chega da escola, ela me puxa, pede para que eu sente no sofá, escolhe um de seus livros e pede para que eu leia, ou melhor, para que ela conte a história e eu repita. Basta que eu leia com entusiasmo para ela decorar os mínimos detalhes: até mesmo aqueles temperos que foram incluídos por mim para dar mais emoção à história. Me sinto co-autora dessas narrativas e aos pouquinhos ela também vai assumindo esse papel.

Esses momentos mágicos me transportam para a minha infância, quando eu e minha família morávamos em São Paulo e a minha mãe trabalhava tanto que não sobrava tempo para muitas fantasias. Mas nas férias, meus pais nos levavam para Caratinga e nesse cantinho mineiro existia uma avó incrível que nos conduzia para um mundo encantado. Todos os primos se amontoavam para ouvi-la contando histórias que ela, por ser analfabeta, contava apenas com a ajuda da memória. Até hoje os personagens das narrativas que ela inventava ou recordava, povoam a minha mente.

Hoje, quando conto histórias para crianças, prefiro lançar mão dos livros. Com a ajuda dos ilustradores e dos autores vou redescobrindo e me deliciando com o universo infantil. Minha filhinha ajuda muito no trabalho de seleção das histórias e cada vez que levo um livro diferente para ela e para os meus meninos da Fazer Arte, sei que corro o risco de ser lembrada por eles pelo resto da vida - como a minha querida vó Lolô fez comigo!

sexta-feira, 13 de junho de 2008

A história abaixo foi criada para discutir um assunto delicado: abuso sexual na infância

Talvez essa história seja publicada um dia, mas enquanto isso não acontece, aproveite o blog para discutir o assunto com uma criança que você ama! Se necessário, acesse os links ao lado para re-conhecer a urgência do tema.

História para orientar sobre abuso sexual na infância

se você é professor ou professora e trabalha com crianças, já deve ter lido alguma história sobre esse tema. Conte-me, por favor, se você gostou da história, se leu para seus alunos e como eles reagiram.

quarta-feira, 4 de junho de 2008

YouTube iluminando a aprendizagem de Biologia

Atire a primeira pedra quem nunca dormiu durante uma aula sobre mitose e meiose, enquanto um professor dedicado tentava desesperadamente fazer você compreender a divisão celular. Para "construir" o conceito, esse mesmo educador te obrigava a desenhar um monte de palitinhos que para você representavam muito pouco, mas para ele eram de fato os cromossomos, com suas cromátides maravilhosas.

Felizes são os alunos de hoje que contam com animações incríveis como essas da barra ao lado. Em poucos minutos todo o processo está ali. Alguns críticos poderão dizer que agora perdeu a graça: os alunos não precisam mais imaginar! Mas para os que gostaram da novidade, é só ter paciência de pesquisar no YouTube. Tem muita bobagem... mas vale navegar!

segunda-feira, 2 de junho de 2008

Aprendendo biologia no cinema

Olá pessoal, hoje quero partilhar com vocês a minha dissertação de mestrado: A Ciência e o cientista através da janela mágica – estudo de caso com o filme Sonhos Tropicais, apresentada no final do ano passado no Instituto Oswaldo Cruz.

Nesse trabalho, orientado pela professora Luisa Massarani, sugiro o uso de filmes como uma das possibilidades para tornar a aprendizagem de biologia mais instigante para o ensino médio. A escolha de um filme brasileiro foi proposital para, a partir da nossa realidade refletida na tela, estimular o interesse dos jovens pelos filmes brasileiros e pela ciência que é produzida no Brasil.

O filme Sonhos Tropicais, lançado em 2002 e dirigido por André Sturm, traz questões muito atuais, principalmente nesses dias em que integramos a arena da luta contra o dengue no Rio de Janeiro. Na tela, também acompanhamos um momento de intensa crise na saúde do Rio de Janeiro, mas o momento retratado é o início do século XIX. Nesse período, a cidade era apelidada de “Túmulo dos Estrangeiros” porque os tripulantes dos navios estrangeiros, com medo de epidemias como: febre amarela, peste bubônica e varíola, evitavam atracar no Brasil. Essa situação comprometia a economia do país, que nesta época estava concentrada na produção e exportação do café.

O filme mostra que para enfrentar os problemas da época, o cientista Oswaldo Cruz foi convidado para combater as principais epidemias que afastavam os investidores estrangeiros. O espectador pode perceber que, ao mesmo tempo, estava acontecendo uma intensa reforma arquitetônica em que os cortiços davam lugar aos palácios e avenidas. Para promover essas mudanças, parte da população foi violentamente desabrigada ou tiveram suas casas invadidas pelos agentes de saúde.

A insatisfação desse grupo de cidadãos e a organização dos opositores do então presidente Rodrigues Alves somaram forças para contestar as medidas de saneamento consideradas arbitrárias. O auge da crise foi a proposta da vacinação obrigatória que resultou no episódio conhecido como a “Revolta da Vacina”.

Apesar da relevância histórica e científica desse episódio, ele ainda é pouco estudado nas aulas de biologia do ensino médio, mas há uma lição significativa na Revolta da Vacina: a importância do envolvimento da população nas ações de saúde. A história dos cientistas brasileiros também ganha pouco espaço no ensino de biologia e por isso "Sonhos Tropicais" pode ser uma oportunidade para trazer essas discussões.

Além de representar a Revolta da Vacina, o filme narra o drama das polacas, jovens judias de origem polonesa, trazidas para o Brasil com uma falsa promessa de casamento. Longe de seus familiares e sem entender o idioma local, as polacas eram exploradas nos bordeis e rechaçadas pela sociedade.

Por que não fazer do ensino de biologia um espaço para refletir e combater ações que violam os direitos humanos como a exploração sexual de mulheres e crianças, tão comuns na nossa contemporaneidade?

Para saber como os jovens reagiriam às densas questões tratadas no filme, contamos com dois grupos colaboradores. O primeiro grupo, monitores no Museu da Vida, foi formado por jovens que vivem em situação de risco social e moram nas adjacências da Fundação Oswaldo Cruz. O segundo, grupo foi formado por alunos de uma escola privada: a escola Parque-Barra. Embora em situações econômico-social opostas, esses jovens tinham em comum o fato de estar cursando ou já haver cursado o ensino médio.

Nossos colaboradores assistiram ao filme, participaram de um grupo focal, onde foram estimulados a discutir os temas tratados no filme, de acordo com o interesse de cada grupo. Por exemplo, o grupo do Museu da Vida revelou intensa identificação com a situação de pobreza da população que se rebelava contra a vacina e com a precariedade dos serviços públicos oferecidos a essa população. Já o grupo da Escola-Parque mostrou-se sensibilizado com o drama das polacas. Para que pudessem se expressar individualmente, cada jovem preencheu um questionário. Além disso, realizamos um júri simulado a fim de que cada grupo vivenciasse uma imersão na história e avaliassem a responsabilidade dos cientistas em uma crise de saúde pública.

Toda essa participação foi gravada posteriormente transcrita na íntegra.

O conteúdo desse material foi analisado através de métodos qualitativos e exploratórios, por isso, os resultados obtidos com esses grupos de jovens não podem ser generalizados para a totalidade dos jovens brasileiros, mas nos permite apontar tendências sobre o uso do filme “Sonhos Tropicais” entre jovens.

Nossos resultados mostram que o filme promoveu uma discussão calorosa de temas como a história da ciência brasileira, em especial a vida e a obra de Oswaldo Cruz e a Revolta da Vacina e permitiu uma reflexão sobre o problema da exploração sexual no Brasil e no exterior. De acordo com o relato dos jovens, a participação na pesquisa favoreceu a apropriação de conhecimentos apresentados no filme e nas literaturas que disponibilizamos nos encontros que promovemos com os grupos.

Além do trabalho desenvolvido com esses jovens, a pesquisa traz na íntegra as entrevistas que realizamos com o escritor Moacyr Scliar, que é autor da obra original, com André Sturm, o diretor do filme Sonhos Tropicais, com Rosália Duarte que é pesquisadora da PUC e autora do livro “Cinema e educação” e com Felicia Krumholz, então coordenadora do projeto Cine-Escola do Grupo estação.

Essas entrevistas permitiram o mapeamento das motivações que levaram à criação da história e à adaptação do romance para as telas de cinema. Também permitiram que discutíssemos o trabalho de pessoas que militam para que a sala de cinema seja um espaço privilegiado de aprendizagem, tanto no ensino formal como no não formal.

De certo modo, partimos da gênese da narrativa “Sonhos Tropicais”, percorremos o seu trânsito do texto para a tela e observamos a percepção e a aprendizagem a partir dessa obra.

Motivações...

Uma das principais motivações para o desenvolvimento dessa pesquisa é que para mim, o cinema tem sido o entre-lugar da diversão e do aprendizado. Por isso, como professora de ciências e biologia, procuro estar no cinema com os meus alunos. Essa prática me aproximou de pessoas que fazem, exibem ou pesquisam cinema. Quando passei a atuar como assessora pedagógica de projetos que levam alunos ao cinema, observei que não era comum que os meus colegas professores de ciência e biologia freqüentassem com seus alunos uma sala de cinema, como acontece regularmente com profissionais que atuam no ensino de história, literatura e outras áreas. Esse problema pode ser um objeto para futuras investigações, mas já sabemos que a inclusão de uma disciplina ligada ao cinema nos cursos de formação dos professores é um diferencial nos cursos de formação dos professores de história e literatura. Entretanto, esse território pode ser compartilhado, afinal, existe uma gama de opções de filmes que representam a ciência e o cientista. Um dos anexos da minha dissertação traz uma coletânea com imagens e informações de 78 filmes que apresentam esse enfoque. Espero que outros educadores se interessem em analisar alguns desses filmes com seus alunos e que publiquem o relato dessas experiências.

O compartilhamento dos resultados do meu trabalho depende de espaços de divulgação, como esse. Por isso, agradeço a sua ateção, caro leitor. Aproveito a oportunidade para fazer ecoar um apelo aos coordenadores dos cursos que formam professores de ciências e biologia para que ofereçam aos futuros educadores a qualificação necessária para que se possa explorar a ciência e o cientista no cinema e em outras artes que ampliem o interesse dos jovens pela ciência.

Bem, é isso. Eu sou Silvania de Paula e falei com vocês sobre o uso de filmes para incrementar as aulas de biologia, tema da minha dissertação de mestrado, apresentada em 28 de setembro de 2007, na Fundação Oswaldo Cruz. Vale lembrar que o cinema encanta e desperta o interesse dos jovens. Por isso, sempre que for possível apresentar a ciência e o cientista através dessa janela mágica, a aprendizagem será ainda mais significativa e prazerosa. Até a próxima!

domingo, 1 de junho de 2008

Dividindo uma experiência no MAM

Além de professora de biologia, atuo como contadora de histórias. Por isso, concluí que eu não poderia deixar de visitar o 10º Salão FNLIJ do livro infanto-juvenil no MAM-RJ. No último sábado levei minha mãe e minha filha para essa "viagem", mas não tivemos muita sorte. Além de um calor insuportável e do ambiente lotado, os preços dos livros estavam proibitivos. Pelo menos os livros com histórias que eu tenho prazer em contar. Por exemplo, o livro "O Pote Cheio" de Demi me foi oferecido por 29 reais, mais do que os 27 reais que eu havia investido na semana anterior em uma livraria considerada elitizada: a Prefácio de Botafogo.

Em um dos stands vi uma mãe perguntando o preço do fascinante livro "Toda criança gosta", ao ouvir o valor ela respondeu humildemente: deve ser bom mesmo! Longe de ser ingênua, essa fala denuncia que a política adotada pela maioria das editoras é elevar os preços dos livros que fazem pensar e sonhar. Daí em diante comecei a observar a postura da maioria dos pais que visitavam a feira: de mãos para trás e jeito desconfiado eles olhavam, olhavam, mas raramente compravam. Possivelmente muitos se encantavam, mas não investiam tanto quanto gostariam.

Embora cresça o interesse por esse artigo tão fundamental na formação do ser humano, ainda é tímido o investimento em livros infantis pelo grande público, até porque faltam recursos financeiros e hábito da leitura. Sem esses atributos, como conquistar a sensação de segurança para escolher o livro certo diante de tanta oferta? Uma das saídas é apelar para as promoções. Então fica a questão: quais os livros que estão sendo mais vendidos durante o evento e para quem? Definitivamente me recuso a comprar livros em que as crianças são representadas em forma de "diabinhos" gritando: "quero o meu jantar". Também me recuso a oferecer para as minhas crianças um livro em que um papagaio aparece fumando um charuto. Isso para citar apenas duas obras que considero impróprias para menores. Entretanto, esses livros eram vendidos no salão por cinco reais, um valor que a maioria dos pais estavam dispostos a pagar, ou eram oferecidos gratuitamente – sem comentários!

Para não sair de sacola vazia, levei pra casa um primor de livro ilustrado por Mariana Massarani e escrito por Renata Pentegill "A criança mais importante do mundo". Primeiro a simpática atendente me disse que o livro custaria 21 reais, mas com uma tímida negociação ele me saiu por 18 reais. Ao chegar em casa, procurei um link para indicar a obra aos meus amigos e descobri que na Americana.com o livro me sairia por menos de 15 reais – sem ingressos ou estacionamento. Ou seja, é possível comprar bons livros, sem gastar muito, mas essa não parece ser uma preocupação dos expositores que eu visitei.

Conhecer e discutir com os autores preferidos é uma experiência valiosíssima. Além disso, a colisão dos saberes que ocorre nos encontros dos leitores que partilham suas paixões literárias compensa o esforço das pessoas que se empenham para que a feira aconteça. Mas é preciso que a qualidade do material exposto seja discutida de forma crítica e isenta de interesses meramente econômicos.

Vivendo em uma cidade que, embora maravilhosa, transmite o medo de abrir as janelas, escolho contar histórias que ampliem a capacidade de sonhar, como o maravilhoso livro de Frank Asch "Feliz Aniversário, Lua". Quero que meus meninos aprendam a amar o corpo que carregam, seus colegas e professores, seus pais e o ambiente em que vivem. Por isso, a cada semana, para cada turma, ofereço um novo livro, escolhido com cuidado e carinho. Uma tarefa árdua e cara!